Mike Shinoda e Chester Bennington deram uma entrevista para o site Guardian.co.uk após o show tão aguardado na Praça Vermelha. Os cantores abrem o jogo sobre a banda, seu passado, e as mudanças entre um álbum e outro. Abaixo segue a matéria traduzida na íntegra.
Linkin Park: ‘Nós somos famosos, mas não somos celebridades’Após balançar a Praça Vermelha, Linkin Park fala sobre lutar com alguns demônios e achar um novo propósito.
É quinta-feira a noite em Moscou; Linkin Park está tocando na estréia de Transformers 3 em uma extremidade da Praça Vermelha, na sombra do Kremlin. A segurança do show consiste em linhas de policiais militares. De repente, telas começam a mostrar explosões nucleares, e o rosto gigante, e perturbado de J. Robert Oppenheimer – o físico que trabalhou na criação da bomba atômica, e em seguida agonizou sobre o que havia criado. Enquanto ouvimos ele entonar “Eu me tornei a morte, o destruidor dos mundos”, milhares de fãs russos levantaram placas onde líamos Wisdom (sabedoria), Justice (justiça) e Love (amor).
O gesto – em um evento que acontecia a metros da sede da Guerra fria para gerações sucessivas – é dado seu poder porque não foi algo criado pela banda, ou sua gravadora, ou a companhia do filme, mas pelos próprios fãs, viralmente, através de fóruns na internet.
“Isso nos atingiu totalmente,” diz o vocalista Chester Bennington. “Eu tive esse pensamento de que ali estava uma banda americana tocando politicamente, música carregada emocionalmente ao lado do Kremlin. Eu podia sentir o peso dos anos crescendo e dizendo que esse era um lugar fora dos limites. Então para os fãs se expressarem desta forma foi realmente comovente; algo que nós nunca iremos esquecer, porque foi inacreditável.”
É uma conversa que você esperaria ter com U2, talvez, não uma banda cujo o álbum de estréia que vendeu 20 milhões em 2000, Hybrid Theory, os fez reis comerciais do nu-metal, um gênero sinônimo com gritos de raiva e guitarras muito altas. Mas hoje Linkin Park dirige carros híbridos, compensando sua emissão de carbono e tomaram um outro rumo não diferente do que Radiohead tomou com Kid A. Um processo que eles descrevem como “destruindo e reconstruindo a banda” os levou ao album do ano passado produzido por Rick Rubin A Thousand Suns, um album conceito sobre os medos humanos, incluindo guerra nuclear, com eletrônica e músicas estranhamente belas, como Waiting For The End.
“Quando você se expõe com um album como Hybrid Theory, de um ponto de vista empresarial é realmente muita burrice não continuar fazendo aquilo,” diz Bennington, todo sorrisos, com seus alargadores grandes e pretos, e braços tatuados, o único sinal visual de seu passado nu-metal. “Mas nós não somos fabricantes. Somos artistas, e nós voltamos filosoficamente para quando escrevíamos música antes de vendermos um álbum. Quando nós estávamos animados com uma música, não porque…”
Raper e multi instrumentalista Mike Shinoda interfere: “…Será um sucesso!”
Uma semana depois do show em Moscou, o par – cujo os atos fornecem à banda com sua energia de palco – está relaxando no hotel Mandarin Oriental em Londres, onde a realeza do rock geralmente fica quando estão na cidade. Mais amigáveis e engraçados do que se espera da angústia de suas músicas, eles são diferentes um do outro ao vivo como são no palco: Shinoda seco e pensativo, Bennington vivo e aberto. Mas assim como na apresentação, eles desencadeiam um ao outro incessantemente. A reinventação do Linkin foi muito pessoal para ambos.
Shinoda é nipo-americano. Durante a Segunda Guerra Mundial, seus avós naturalmente japoneses, que haviam migrado para os Estados Unidos, estavam entre os 110.000 nipo-americanos internados em “campos de recolocação” da guerra. Quando eles estavam gravando A Thousand Suns, Rubin sugeriu que Shinoda escrevesse as letras através do método de fluxo de consiência, e ele então viu anos de memórias familiares serem desenterradas de repente.
“Porque não foi somente a guerra,” ele diz. “Foi o medo em sua vizinhança e tudo mais, por anos. Meu pai lembra de estar com o meu tio na escola, e o professor dizer abertamente para a classe que os japoneses eram cidadões de segunda classe e que não deveriam ser confiáveis. Antes da guerra minha família tinha uma mercearia e uma barberaria, mas depois do internamento, foram destruídas e eles tiveram que começar tudo de novo como catadores de morango. Mas eles não falam sobre isso. Eu queria contar essas histórias porque ninguém mais irá.”
O passado de Bennington é, Shinoda rapidamente apontou, “mais extremo”. Seus pais se divorciaram quando ele tinha 11 anos o que o levou a fumar maconha, que levou a cocaina e metanfetamina. Em algumas entrevistas anteriores, ele fez alusão ao abuso sexual por um amigo mais velho do sexo masculino.
“Quando eu era novo, apanhando e sendo praticamente estuprado não era divertido,” ele diz de repente, confidenciando-se. “Ninguém quer que isso aconteça com você e, honestamente, eu não lembro quando começou. Mas por volta de uns quatro anos atrás eu fui visitar a minha mãe e eu vi uma foto minha e lembrei claramente quando aquela foto foi tirada. De repente, pelo fato de ter filhos, eu olhei e pensei: ‘Nossa, é assim que eu era.’ E então eu lembrei. Oh meu Deus. Eu lembrei daquilo acontecendo comigo naquele momento e mesmo pensando sobre isso agora me faz querer chorar. Oh Deus, aquela merda estava acontecendo comigo e eu era apenas um garoto, mais cedo do que eu me lembrava. Meu Deus, não me admira que me tornei um viciado em drogas. Não me admira que eu fiquei completamente insano por um tempo.”
O trauma de Bennington incitou Hybrid Theory e o hit de 2003, Meteora. O sucesso que eles atingiram foi, para Bennington, “como algo que você lê em um livro. Não acontece na verdade. Eu segui meu instinto porque todo mundo estava fodido, e eu não gostava das coisas de ninguém, então eu iria fazer a minha própria.”
Apesar de Bennington ter ido e vindo na música por um tempo antes do Linkin Park se juntar, quando o sucesso veio, veio rapidamente. Eles perceberam que as coisas estavam mudando quando o par dirigiu até a casa do pai de Bennington e ouviu sua música no rádio. “Foi a experiência mais surreal,” lembra Shinoda, sorrindo com a lembrança. “Haviam várias rádios e nós estávamos em todas. Foi tipo, ‘Puta merda!’ Foi tão legal.”
Bennington deixou de dormir na parte de trás de um Toyota antigo para estar na frente do que era o álbum de estréia mais vendido do século 21. Fãs tocavam música alta na frente de sua casa. Uma mulher causou um acidente de carro após vê-lo na rua. Bennington não achou a mudança fácil, ele voltou a abusar seriamente de drogas.
“Infelizmente, minha ex-mulher [Samantha, com quem ele casou quando eles eram tão pobres que não podiam comprar um anel de noivado] e eu éramos muito tóxicos um para o outro, muito jovens para casar,” ele diz. “Nós éramos personalidades voláteis, e mesmo que tenhamos ajudado um ao outro, não éramos bons um para o outro, e isso trouxe outros sentimentos.”
“As turnês que fizemos no começo, todo mundo que esteve conosco estava ou bebendo ou usando drogas,” diz Shinoda. “Eu não consigo imaginar ninguém sóbrio. Então você pega alguém que já tem uma queda por drogas e…”
“Eu festejava com todo mundo,” diz Bennington. Isso não ajudou a formar laços com o resto da banda – que era mais ligada em maconha e bebida, e não faziam idéia que seu cantor estaria sentado no ônibus de turnê viajando. Ele diz que ele sabia qual seria a resposta: “Foda-se, cara. Olha o que temos aqui. Que porra você está fazendo?”
Não era somente a banda que era mantida no escuro. O Linkin inicial era notoriamente uma unidade fechada. Os jornalistas que os entrevistavam voltavam com contos confiscados de celulares e respostas monossilábicas.
“Nós conversamos sobre isso recentemente, e percebemos que estávamos na defensiva,” diz Shinoda. A velocidade de seu sucesso levou a suspeitas de que foram produzidos, e para Bennington a acusação de que de alguma forma “não era real” foi um corte profundo.
“Eu digo, ‘Foda-se, você não me conhece,” ele despeja, socando uma mão com a outra. “E, pessoalmente, eu gostaria de pular sobre a mesa e matá-lo. Como se atreve a questionar sobre o que eu canto?” Eventuamente, eu pensei: ‘Ok, quer saber? Isso é de onde eu venho!’ e eu disse a um jornalista coisas que nunca disse a ninguém. E meu pai – um policial – me liga e diz: “Que diabos você quer dizer quando diz que isso aconteceu com você quando você era criança? Quem fez isso?’ E eu pensando: ‘O que eu fiz?’”
Eventualmente, Bennington revelou a identidade de seu aggressor a seu pai. Ele percebeu que seu agressor havia sido a vítima e escolheu não persegui-lo. “Eu não precisava de vingança. Eu percebi que…”
Shinoda silenciosamente terminou a frase: “Isso pode acabar com você.”
E acabou, mas somente depois de muita terapia. A metamorfose do Linkin começou em 2007, quando eles se juntaram com Rubin para o experimental Minutes to Midnight, depois de Bennington mudar a sua vida. “Eu me tornei uma pessoa que eu não era,” ele suspira. “Este sou eu. Eu sou um cara, legal, amigável que sempre esteve preso atrás deste monstro que era somente um garoto realmente machucado.”
Bennington se divorciou em 2005 – sua ex-mulher, a mãe de seu primeiro filho, se tornou uma “grande amiga, e grande mãe, e eu me arrependo de cada coisa ruim que já falei sobre ela na imprensa”. Em 31 de dezembro de 2005 ele se casou com Talinda, uma professora e ex-modelo. A relação o transformou, e com terapia, reabilitação e fé “desbloqueou todas as coisas que vim carregando todos esses anos”. Quando Linkin voltou ao estúdio, ele descobriu que seu estilo vocal havia mudado do rugido anterior para algo menos agressivo.
“Eu percebi que não tinha mais essa besta interior,” ele diz. “Eu não queria gritar.”
Desde então, Linkin Park mudou seu modus operandi. “Se fizéssemos outro álbum como os dois primeiros, teríamos feito o mesmo álbum até nos separarmos,” diz Shinoda, revelando que a banda também reconectou – em alguns casos iniciou – amizades uns com os outros. “Mas nós percebemos que não tínhamos que provar nada para ninguém. Linkin Park pode ser tanto liríca como sonoricamente aventureiros como queremos.”
“Música pode ser política de um jeito que nunca vi antes – apresentar certas músicas na Praça Vermelha ou Tel Aviv pode realmente afetar as pessoas,” diz Bennington.
Ele ainda encontrou problemas – em 2008, um assediador chamado Devon Townsend foi preso após invadir seu computador, acessando sua secretária eletrônica e e-mails, roubando centenas de fotos de seus filhos. “Não é divertido colocar alguém na prisão,” ele diz. “99% dos fãs são ótimos. Nós somos famosos, mas não somos celebridades. Eu posso ir a mercearia e ao correio. As pessoas dizem: ‘Você se inscreveu para isso.’ Não, na verdade, nós nos inscrevemos para fazer música, não para expor nossas famílias para pessoas loucas. Mas agora é tudo sobre a música. E nós só estamos começando.”
Fonte: Linkin Park BR
0 comentários:
Postar um comentário